Parte II - Fundamentos do Budismo - A inseparabilidade do corpo e da mente

segunda-feira, 17 de março de 2008

Desde a antiguidade, filósofos e teólogos vêm formulando conceitos variados sobre a relação entre mente e corpo. Embora numerosas e de tipos diferentes, as doutrinas nascidas desses conceitos situam-se sem exceção em uma de duas categorias gerais: materialistas e espiritualistas. No entanto, nem materialismo nem espiritualismo são explicações satisfatórias da realidade, se consideradas como explicações exclusivas. A matéria não pode ser compreendida em termos de espírito nem, reciprocamente, o espírito em termos de matéria. São compreensíveis somente em termos de unidade.

A relação entre corpo e mente é expressa no conceito budista de shiki shin funi. A palavra shiki (corpo) representa todos os fenômenos da vida que podem ser compreendidos por meios científicos ou fisioquímicos. Em outras palavras, shiki é o aspecto material da vida. Ele inclui tudo aquilo que pode ser discernido, como por exemplo, a cor, a forma e a textura. Shin (mente ou espírito) refere-se aos vários aspectos fenomenais da vida e aos distintos tipos de atividades espirituais que são invisíveis e não podem ser apreendidos em termos de métodos fisioquímicos. Incluídos em shin estão a razão, o intelecto, os desejos e as emoções que são objeto de investigação dos espiritualistas.

Nos ensinamentos budistas esses aspectos são ao mesmo tempo separados e unos e são indicados pela palavra funi, que significa "dois mas não dois" e "não dois mas dois". Isso até pode parecer algum tipo de enigma ou advinhação, mas não é. Embora possamos observar mente e corpo separadamente, em essência eles são unos. Nenhum é originado pelo outro. Além disso, um não pode existir sem o outro.

Uma pessoa pode conhecer a mente de uma outra ouvindo sua voz. Isto porque o aspecto físico revela o aspecto espiritual. Assim, os aspectos físico e espiritual, que são unos em essência, manifestam-se como dois aspectos distintos. Todas as funções da vida são reveladas tanto física como espiritualmente. Por exemplo, o sono que revigora o corpo tem também um papel psicológico vital. A leitura de um livro que estimula e distrai nossa mente, envolve o uso de nosso corpo.

As atividades espirituais e invisíveis da vida são, naturalmente, mais difíceis de serem analisadas do que as ações visíveis. Elas só podem ser observadas por suas manifestações físicas.

Na sociedade como um todo observamos uma ênfase no aspecto material. No entanto, certos acontecimentos, na maioria das vezes trágicos como o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001, em Nova York, Estados Unidos, levam a humanidade a repensar a questão e a concluir que é impossível estabelecer uma sociedade realmente próspera sem considerar o aspecto espiritual. Isso não quer dizer que a humanidade deva ignorar o aspecto material. As pessoas necessitam de valores, como a honestidade, mesmo na busca do materialismo. Uma sociedade próspera deve atribuir igual importância a ambos os valores, espiritual e material. Como eles são inseparáveis, o bem-estar mental não pode existir sem o bem-estar físico e vice-versa.

A prática do Budismo de Nitiren Daishonin não está voltada unicamente para a iluminação espiritual. Ela influencia nossa vida no nível fundamental. A recitação do Nam-myoho-rengue-kyo nos afeta mentalmente em vários aspectos, dando surgimento ao otimismo, à determinação e à alegria. Ao mesmo tempo, ela afeta cada célula em nosso corpo. Por essa razão, a boa postura, a concentração e o ritmo constante são importantes durante a recitação do Daimoku.

O objetivo da prática budista é melhorar a vida de uma pessoa em todos os aspectos. Portanto, a oração contribui para a melhoria das circunstâncias materiais como também para o bem-estar espiritual das pessoas.

O Budismo de Nitiren Daishonin define dois tipos de benefício: conspícuo e inconspícuo. O primeiro pode ser entendido como a melhoria das circunstâncias materiais ou físicas, enquanto o segundo, como a melhoria de nosso caráter, o desenvolvimento de nossa sabedoria e o aumento de nossa energia vital. Em essência, esses dois tipos de benefícios não podem ser separados. Por exemplo, a elevação da sabedoria e energia contribui para uma vida mais saudável e mais ativa na sociedade.

ABRIL DE 2002 — Revista Terceira Civilização - Editora Brasil Seikyo
 EDIÇÃO Nº 404

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