São Paulo Após terminar o curso de Direito na tradicional Universidade Mackenzie, em São Paulo, ao invés de seguir carreira como advogado, juiz ou promotor, o paulista Arthur Simões Cardoso, de São José dos Campos, decidiu pegar sua bicicleta e correr o mundo. Isso mesmo, não é figura de linguagem, ele foi dar a volta ao mundo sobre duas rodas. Neste momento, após percorrer a América do Sul, Oceania e Ásia, em quase 22 meses de viagem, o ciclista está na Península Arábica, onde já visitou Emirados Árabes Unidos, Omã e se prepara para partir para o Iêmen.
"Quando me formei percebi que trabalhar na área do Direito não era muito o que eu queria, então eu parti para a realização de um sonho e entrei de cabeça. Aí surgiu o projeto Pedal na Estrada", disse Cardoso à ANBA por telefone de Muscat, capital de Omã. O rapaz, hoje com 26 anos, batalhou patrocínios e apoios e, em 08 de abril de 2006, partiu do Parque do Ibirapuera, o mais famoso de São Paulo.
De lá para cá ele pedalou 25 mil quilômetros por 22 países: Brasil, Paraguai, Argentina, Chile, Bolívia, Peru, de lá para Nova Zelândia, Austrália, Indonésia, Cingapura, Malásia, Tailândia, Camboja, Laos, Mianmar, Índia, Bangladesh, Nepal, Paquistão, Irã, Emirados e agora Omã. Para atravessar oceanos e mares, Cardoso foi de avião ou barco. "Mas onde tem estrada eu vou de bicicleta", afirmou.
Mais do que "circumpedalar" o globo, o objetivo de Cardoso é partilhar suas experiências com quem tiver interesse. No site www.pedalnaestrada.com.br ele mantém um diário de viagem. O material, de acordo com o ciclista, tem sido usado em sala de aula por professores de escolas como o Mackenzie, o Bandeirantes e da rede pública. "Todo o material que eu crio é utilizado como complemento do ensino aos estudantes, pois eu falo de cultura, costumes, curiosidades, problemas. Procuro dar um panorama do país", disse.
O contato direto com as pessoas desmistificou imagens pré-concebidas que Cardoso tinha dos países por onde passou. "Consigo ver que mesmo em culturas muito diferentes existem diversas convergências e também como diferenças às vezes muito pequenas geram efeitos gigantescos", afirmou.
No caso da Índia, por exemplo, apesar de ser um país em franco crescimento e candidato a uma das grandes potências do século 21, Cardoso viu uma pobreza opressiva. No Paquistão e no Irã, onde pesam imagens de violência e fanatismo religioso, ele conheceu pessoas muito hospitaleiras.
"Quando você chega ao Irã, por exemplo, encontra um país desenvolvido, rico, onde as pessoas são educadas e hospitaleiras. Não vi um morador de rua sequer", afirmou. "O Irã leva a fama de ser do 'Eixo do Mal', mas estando lá a gente percebe uma coisa bem diferente e é bom partilhar isso, quebrar paradigmas", ressaltou. "Os muçulmanos são, provavelmente, as melhores pessoas com quem já cruzei. É interessante ver, escrever sobre isso e ver as respostas das pessoas. Desperta nelas a vontade de viajar", acrescentou.
Fica lá em casa
Cardoso chegou nos Emirados Árabes no dia 06 de janeiro. O que mais chamou sua atenção na região foi o rápido desenvolvimento. "Há 50 anos só havia deserto, em Omã não havia carros, nos Emirados as pessoas viviam em casas de barro com telhados de palha e andavam de camelo. É interessante ver como em um curtíssimo espaço de tempo estes países se modernizaram tanto", disse. Hoje Dubai, por exemplo, é conhecido pelo tráfego intenso de veículos e por seus arranha-céus.
Ele ficou espantado também com a simpatia do cidadão comum, tanto que em Omã acabou dormindo em casas de pessoas que havia acabado de conhecer. "Fui na mesquita tomar banho e pedi informações para um senhor, se ele poderia indicar algum lugar para ficar. Ele me convidou para ficar na casa dele", afirmou "Você conhece pessoas na rua e elas te ajudam", acrescentou.
Para Cardoso, a bicicleta ajuda a abrir portas, pois as pessoas sentem simpatia por alguém que se aventura pelo mundo sozinho e que não oferece perigo. O mesmo não ocorreu em países muito populosos por onde passou, como Indonésia, Bangladesh e Índia. O fato de ser brasileiro também ajuda, especialmente por causa da paixão mundial pelo futebol. "Ronaldo, Ronaldinho e Kaká são nossos embaixadores", declarou.
A reclamação, nos Emirados, ficou por conta da polícia. O ciclista diz que das duas vezes que precisou de auxílio não foi bem atendido. A primeira foi quando furtaram a bicicleta de um amigo italiano, que o acompanhava desde o Irã, em frente a um supermercado em Dubai. Os policiais não foram muito solícitos na tentativa de encontrar o ladrão. A segunda foi quando a van que ele tomou para ir de Abu Dhabi a Dubai capotou na estrada, durante um dos dias de chuvas inéditas e torrenciais que caíram no país em janeiro. Parte de seu equipamento foi danificada e ele queria um boletim de ocorrência para acionar o seguro, mas confrontado novamente com a má vontade da polícia acabou desistindo.
Caramujo
Quando o orçamento permite o aventureiro dorme em hotéis ou albergues, quando o dinheiro é curto ele conta com a boa vontade dos cidadãos ou acampa. Seu patrocinador é a empresa farmacêutica Bristol-Myers Squibb, que deposita todo mês uma quantia como se fosse um salário. A marca norte-americana de bicicletas Fuji providencia peças de reposição.
Na viagem, Cardoso carrega consigo uma série de coisas para garantir sua independência - "assim como um caramujo leva a casa nas costas"-, como peças de reposição para a magrela, barraca, saco de dormir, um pequeno fogareiro, roupas, remédios, produtos para higiene pessoal e equipamentos para registrar suas aventuras, como um notebook, uma câmera fotográfica, uma pequena filmadora e um IPod para ouvir música. São ao todo 50 quilos de carga. "Todo o equipamento fica pesado", disse.
A idéia inicial era percorrer 28 países em dois anos e meio, mas o número de nações e o tempo vão subir, já que o ciclista vai passar ainda pela África, depois de volta ao Oriente Médio, Europa e, talvez, América Central. Essa primeira passagem pelo Oriente Médio não estava prevista, já que do Irã Cardoso pretendia seguir para a Turquia, depois para Bulgária e Grécia e, em seguida, passar pela região do Levante em direção à África.
O inverno no Hemisfério Norte, no entanto, o fez mudar de idéia, pois havia previsão de muito frio na Turquia. "Aqui (na Península Arábica) é quente praticamente o ano todo, depois eu vou passar pela África e provavelmente vou chegar na Europa já no verão", afirmou. Do Iêmen Cardoso pretende ir para o Dijibuti, depois Etiópia, Sudão, Egito, Jordânia, Líbano, Síria, Turquia e de lá para a Europa.
Quando voltar ao Brasil, o ciclista quer continuar a aproveitar os frutos de sua aventura, expor suas fotos, dar palestras e, quem sabe, escrever um livro.
http://www.anba.com.br/noticia.php?id=17280
0 comentários:
Postar um comentário