Exposição 'Seu Sami' - poderá ser conferida no Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro

terça-feira, 4 de março de 2008

São Paulo – A cultura árabe é a grande inspiração do artista plástico Hilal Sami Hilal, que começa todas as suas obras da direita para a esquerda, seguindo a lógica da caligrafia árabe. "Isso aconteceu naturalmente porque meu imaginário todo está calcado na cultura e nos costumes árabes. Quando eu era criança não se falava português na minha casa, apenas árabe. E só comíamos feijão, arroz e batata frita aos sábados. No restante da semana só comida árabe", conta o artista.

Com a curiosidade e a paciência de um alquimista, Hilal, que nasceu e vive em Vitória, no Espírito Santo, descobriu uma "fórmula" para produzir sua própria matéria-prima. Após anos de pesquisa, desenvolveu maneiras de confeccionar papel artesanal que, além de virar obra de arte, trabalha com a memória afetiva do artista. Para produzir o papel, Hilal utiliza basicamente trapos de algodão, vindos de roupas velhas de família e dos amigos.

"O meu processo de fazer papel está ligado à expressão da arte. A idéia da memória afetiva vem para garantir outro significado à obra. Se começo um trabalho a partir de uma camisola da minha mãe ou da camiseta de um amigo, por exemplo, com certeza vários sentimentos ficarão impressos ali", explica o artista que também trabalha com reciclagem de outros tipos de papéis e de fibras de plantas, como seda pura e bananeira.

De acordo com Hilal, apesar de ser uma técnica milenar no Oriente, o papel artesanal ainda é um experimento novo para o Brasil e a América Latina. "Hoje um número razoável de artistas plásticos tem utilizado este recurso como suporte ou mesmo como expressão", conta Hilal, que viajou duas vezes ao Japão para conhecer oficinas de papel artesanal e aprender as melhores técnicas.

Além de artista plástico, Hilal foi professor durante 20 anos do Centro de Artes da Universidade Federal do Espírito Santo, onde concluiu o curso de Artes Plásticas na década de 70. O interesse pela arte surgiu no próprio ambiente familiar. A mãe, Adélia Curry, era artista plástica e usava a técnica de óleo sobre tela. "A pintura e o desenho sempre estiveram presentes nas minha vida. Comecei desenhando cenas da cidade, paisagens, figuras a lápis e aquarela. Depois é que parti para a gravura. Por isso o papel sempre foi um elemento de suporte para o meu trabalho", conta Hilal.

Segundo ele, foi a partir da década de 80 que abriu um canal com seus antepassados árabes e seu trabalho passou a ter as trocas entre os contrastes – oriente x ocidente, passado x presente, corpo x alma, o visível x o invisível - mais presentes em seu trabalho. "Criei um sincretismo: juntei minha experiência brasileira com minha alma árabe", diz. Hoje muitas de suas obras são rendados, um emaranhado de linhas conectadas e unidas entre si.

As obras de Halil já foram expostas em diversos estados brasileiros como Ceará, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná e Rio Grande do Sul. Também no exterior, Alemanha, Equador, Estados Unidos, França, Índia e Líbano.

Seu Sami

Entre os trabalhos que mais garantem orgulho a Hilal está a mostra "Seu Sami", que presta uma homenagem ao pai do artista, Sami Hilal, que morreu quando ele tinha apenas 12 anos de idade. A exposição, que levou um ano para ser preparada, é baseada nas memórias de Hilal e trabalha a questão da perda e a celebração da vida. "Fala da perda, mas para falar do meu grande desejo pela vida", diz Hilal.

A instalação é um registro simbólico da ausência do pai. Os pólos são a Sala do amor e a Sala da dor e, entre eles, uma zona de escuridão. O confronto de espelhos nos extremos faz alusão ao desejo pela companhia do pai, à fase do espelho na criança. A dor é representada nos ornamentos feitos de arame farpado.

Os nomes da família e dos amigos gravados em chapas de cobre compõem a estrutura de alguns trabalhos. Como o dos livros, de cobre e papel, ficam expostos sobre uma superfície de madeira, lembrando uma biblioteca. Outra parte importante da mostra recebeu o nome de Sherazade, título que corresponde ao nome da narradora de As Mil e Uma Noites. A obra tem a forma de um grande livro ramificado, formado pela união de 200 livros menores, com capa azul marinho e papel jornal, que formam uma espécie de labirinto.

"Capas de livros e corpo de livros, maiores do que as capas, se emendam em outras capas e corpos de livros, infinitamente, onde cada capa busca um corpo e cada corpo encontra sua capa, e mais um outro corpo e uma nova capa, que se relacionam, se multiplicam, como uma história sem fim", explica Hilal. De acordo com o artista, o objetivo da instalação é valorizar a narrativa e a questão da sobrevivência, tão evidente nos contos sem fim de Sherazade.

A mostra é itinerante, foi inaugurada no dia 25 de outubro de 2007 no Museu da Vale do Rio Doce, em Vila Velha, no Espírito Santo, onde ficou até o último dia 17 de fevereiro. De 18 de março a 18 de maio, poderá ser conferida no Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro e, em agosto no Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Até o final do ano, a mostra deve passar por pelo menos mais duas capitais, incluindo São Paulo.

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